sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Tudo o que sobe um dia desce na nossa cabeça


Por Priscilla Rios

As mulheres têm uma fase que consiste em jogar tudo pro alto. Quando apaixonadas elas são capazes de se jogarem de cabeça em um relacionamento e, claro, jogar tudo pra cima por aquela pessoa: a casa, a cidade onde mora, a profissão e algumas sacrificam até a família e amigos.
Depois que a paixão ganha consistência e solidifica com o dia-a-dia, a convivência atrai discussões bobas e cíclicas, aquelas que a gente sabe que não nos leva a nada... então quando começa a ficar cansativo e os argumentos repetitivos, a gente desenterra coisas antigas e dá um novo vigor à discussão com acontecimentos empoeirados. Aí entra aquela famosa frase: “e aquela vez que você fez isso, isso e isso..............”. A gente nem lembra mais ONDE nem QUANDO, afinal já faz tanto tempo que os fatos estão embaralhados na cabeça, mas o que importa é que ficou aquele incômodo engasgado, aquela mágoa pontiaguda. Aí até a constituição entra no meio da história, com clichês convincentes como “direitos iguais”. Pra dramatizar um pouco mais, a gente preenche as brechas da história (que não lembramos no calor do momento) com uma interpretação séria e compenetrada, cheia de caras e bocas.
E aí vem o momento culminante da cena, mais uma vez é hora de jogar tudo pra cima: “se você quiser a gente TERMINA AGORA”. Essa chantagem na maioria das brigas quase nunca é levada a sério, mas um dia cansa e a outra parte indignada com a sua facilidade de rasgar o passado resolve por pura petulância aceitar a proposta. Assim, de uma hora pra outra, praticamente cospe na sua cara uma resposta SOLENE e ao mesmo tempo FÚNEBRE: “Tudo BEM. Então VAMOS TERMINAR”. Isso vem como uma flechada cortante ao coração. Significa que você tem que matar imediatamente todo aquele amor fulminante dentro de você e jurar que dessa vez ele morreu. Ou melhor, morreu PARA SEMPRE.
Em segundos, já não lembra mais que tem pernas, braços e sequer quais as funções dos mesmos. Flutua do carro até o portão de casa sem ver nem ouvir nada. A cabeça faz viagens alucinantes entre “que burra que eu fui ao fazer essa proposta estúpida” e “já que ele quer assim, então é assim que vai ser”.
O orgulho vai perdendo a voz conforme a saudade e o desespero aumentam. Aquele nó na garganta cresce conforme o movimento sorrateiro do ponteiro marcando o tempo. Sequer tem espaço para respirar. A dor emocional se materializa e se espalha no físico. As pupilas dilatam, as pálpebras incham, os olhos inundam e a boca seca. O ouvido só escuta as batidas aceleradas do coração, que nesse momento já subiu pra cabeça. A morte nunca pareceu tão perto. A dor no peito é tão forte, que o coração – que no passado já sucumbiu em chamas de delírio e amor - agora arde nas cinzas.
A ausência de um plano “B” e a inesperada aceitação da proposta goela abaixo é de tirar o chão. Você cai. E a queda sem fim nesse abismo parece doer mais do que propriamente o impacto no chão. É quase uma desintegração em queda livre. Até que você resolve se dar uma chance e se pendura no primeiro galho que vê pela frente, um amigo. Em segundos ele te encoraja, te dá força, chama pra sair, mostra que tem vida após a morte.
Daí, você só pensa NELE nos intervalos das risadas, nos intervalos dos programas e durante conversas entediadas. Suspira fundo querendo vê-lo na primeira oportunidade (pensa até em criar a oportunidade, planeja, simula, combina) e também de não vê-lo nunca mais.
Depois, começa a achar que tudo o que houve entre vocês foi ilusão e alucinação juntos. Tão sem importância que ele foi capaz de jogar tudo pra cima, ou melhor, de aceitar sua PSEUDO proposta de jogar tudo pra cima. Será que nenhum neurônio falou pra ele que você estava blefando????
E da forma inesperada como ele saiu ontem da sua vida, ele aparece hoje. Implora pra voltar. Aí você aproveita... dá aquela lição; fala tudo o que tem pra falar, morder e beliscar com palavras (ele nem revida). Em seguida, o cobre de beijos e reforça esse desmedido amor com suspiros, abraços apertados e cochicha no ouvido clichês apaixonados. Resolve tudo com o batido, eficiente e enxuto “te amo”.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

SAC, SIC, SACO!



Por Priscilla Rios

Quem nunca se irritou com aquela gravação dizendo “esse número NÃO EXISTE”, quando você sabe que EXISTE! Ou com aquela musiquinha que fica tocando incessantemente, quando alguém do outro lado da linha decide que vai te dar um chá de cadeira, ou melhor, de OUVIDO.
Na hora em que você mais precisa, quando vai utilizar aquele produto e tem uma dúvida, sempre existe o SAC - Serviço de Atendimento ao Cliente - pra te deixar mais irritado. Aliás, não devia chamar SAC, devia chamar SIC – serviço de IRRITAÇÃO ao cliente. Ou se preferir a denominação em English, SIC pode ser traduzido para DOENTE... DOENTE DE RAIVA!!
Você liga em um 0800 da vida, conta a mesma história dez vezes e eles terminam dando uma satisfação irritantemente educada, que não resolve em nada o seu problema e, se você tiver sorte, eles desligam. Se não tiver, eles jogam aquela famosa frase: “aguarde, vamos TRANSFERIR sua ligação”. E aí começa tudo de novo. APERTE 1 para xxxx, APERTE 2 para yyyyyy, (...) APERTE 15 para TENTAR falar com um dos nossos atendentes (rsrsrsrsrs).
Uma amiga, que divide a sala comigo, simplesmente falou com 9 pessoas do atendimento para tirar uma dúvida. NOVE, dá pra acreditar!? Isso significa que ela contou a mesma história – com direito a início, meio e fim – 9 vezes. Eles diziam, após ela contar a ladainha toda, que iam TRANSFERI-LA para o setor CERTO. Na nova vez, ela mudou o começo e o final da história. Ao invés de começar se apresentando, como de costume, ela jogou logo a pergunta: aí é o SETOR CERTO?? Senão nem começo a contar minha história! Para a irritação dela, dessa vez eles não transferiram a ligação e sim, passaram outro telefone pra resolver o problema.
Ela ligou no outro número e adivinhe, o cara falou: é lá no banco mesmo que a SENHORA resolve o seu problema, não aqui. Antes de desligar, ela perguntou: só pra saber, o tal setor que eles falaram existe mesmo? Ao que o cara respondeu: não SENHORA, esse setor foi extinto há algum tempo. Ou seja, a galera nem sabe que o setor não existe mais (tô bege!!!! Como diria uma outra amiga minha). Eu gostaria de saber então pra onde é que eles estavam transferindo a POx©∑×®©αβ∞ da ligação?!
O bom é que isso sempre vira piada. Aliás, se a gente se esforçar pra ver o lado bom de tudo, a vida vai ter muito mais graça. Em 2009, eu lhe desejo PACIÊNCIA, OTIMISMO, SAÚDE (don´t be SIC!), BOA VONTADE e principalmente BOM HUMOR. Cada um desses ingredientes na dose certa vai somar PROSPERIDADE e bons AMIGOS à sua vida.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Devaneios infelizes sobre a felicidade


Por Priscilla Rios
Até onde o ser humano se permite ser feliz?
Difícil responder essa questão sem entrar de cabeça em um devaneio profundo.
A gente acha que ser feliz depende apenas de fatores externos, mas não. Na maioria das vezes nós mesmos não nos permitimos vivenciar tudo o que sempre sonhamos. Como os pais, que ficam adiando “aquela” viagem por conta dos filhos pequenos e depois que crescem adiam porque não querem ficar longe dos netos e depois, porque se sentem velhos demais pra fazer esse “tipo de coisa”.
E qual namorado já não ficou emburrado porque a namorada passou a tarde longe e à noite quando ela quis ficar perto, ele inventou um programa igual, só pra dar o troco na mesma moeda?! Pra que simplificar se a gente pode complicar né?
E quando o final de semana está chegando ao final, o Fantástico já está no ar, e a gente já começa a entrar em um clima de ansiedade e agonia porque vai começar tudo de novo. Bobeira, claro! Mas, levanta a mão quem nunca sofreu de véspera.
E quando a gente programa cada milímetro do feriado e no final todo mundo fura e você fica se sentindo um lixo. Ao invés de partir pra outra, a gente enumera os culpados e fica remoendo aquilo até aparecer alguma coisa realmente interessante pra fazer.
Isso sem falar quando tudo vai bem: o trabalho, o relacionamento, os amigos, a família - acredite existem dias assim – mas você acha que está faltando alguma coisa, reclama e no final arranja um jeito de terminar o dia triste, se sentindo culpado por reclamar de barriga cheia. Ou pior, sente aquele frio na barriga básico de que quando tudo está muito bom algo ruim vai acontecer em seguida e, claro, fica maquinando as “n” possibilidades do que pode dar errado. Doideira, alucinação. Eu sei.
Desfrutar a felicidade sem culpa do que os outros vão pensar ou invejar e, principalmente, sem medo é algo tão ou mais difícil do que conquistar a felicidade. Talvez por isso é que no final nos restam apenas a soma de momentos felizes, e quase nunca, dias inteiros de felicidade.

sábado, 13 de dezembro de 2008

Matando o tempo....



Por Priscilla Rios

Dias desses ouví a seguinte analogia: quando você nasce, você chora e o mundo está feliz; quando você morre, o mundo chora e você está feliz. Será verdade que a morte é um alento? A pergunta que não quis calar durante séculos, não será respondida agora, por mim, em poucas linhas. Apesar da morte parecer o fim de todos os problemas para muitas pessoas, acho que o anda faltando no dia-a-dia é um pouco de profundidade na vida. Só assim, talvez, as pessoas parariam de procurar soluções na morte.
Falta gente agindo como gente e não como máquina (isso me lembra aqueles atendentes que ligam em casa na hora do almoço).
Faltam crianças correndo nos parques, brincando com bolinhas de gude, carrinhos, cachorros e pulando amarelinha.
Faltam pessoas debatendo idéias, aproveitando a vida, o ar puro (nem mais tão puro assim) e o tempo livre. Aliás, que tempo livre?! As pessoas andam vendendo até as férias!
Com a idéia de casar mais tarde e ter filhos mais tarde pra aproveitar a vida, a turma não anda fazendo nem uma coisa nem outra.
O medo da mudança é tanta, que nem por segurança, muda o trajeto para o serviço.
Nessa onda de alta tecnologia, todo mundo quer mesmo é fazer as coisas com velocidade. Escrever um poema com um simples lápis se tornou uma atitude tão melancólica que nos remete aos exercícios de redação da infância. Dá até uma pontinha de saudosismo, no mesmo tom do Casimiro.
“Oh! que saudades que tenho
da aurora da minha vida
da minha infância querida
que os anos não trazem mais (...)”
(Meus Oito Anos, Casimiro de Abreu)
Na velocidade da luz, hoje as pessoas literalmente voam pra chegar mais rápido. Aquelas viagens de carro com toda a família, com direito a paradinhas para um almoço caprichado na estrada, coca-cola (só podia nos finais de semana) e boas risadas, são tão raros como escrever com um lápis.
Nas ruas, as pessoas caminham depressa. Não passeiam. Também não tem mais aquela coisa interiorana de ir comprar pão na padaria e não ver a hora passar em uma conversa. O tempo urge! E é por isso mesmo que tudo a nossa volta anda prático, rápido e cheio de botões.
Nessa pelada da vida, todo mundo anda jogando igual perna de pau e o mais importante está ficando pra escanteio. Os amigos, a família, o cachorro, o gato e os vizinhos. O gol de placa só vem mesmo com a aposentadoria e até lá a gente vai matando o tempo, literalmente. Fica a eterna esperança de que nos 45 minutos do segundo tempo a gente resolva bater um bolão e dar ouvidos à Clarice.
“Mude,
mas comece devagar,
porque a direção é mais importanteque a velocidade.
Sente-se em outra cadeira,
no outro lugar da mesa.
Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair,
Procure andar pelo outro lado da rua.
Depois, mude de caminho,
ande por outras ruas,
calmamente,...” (Mude, Clarice Lispector)

sábado, 6 de dezembro de 2008

Tanto tempo sem tempo pra nada

Ando pensando no futuro. O problema é que o futuro parece sempre tão distante e quando assusto! Já passou! Planejo de cá, planejo de lá. Crio mestrados e doutorados pomposos que nunca saem da Terra do Nunca. E a cada ano novo imponho: vou trabalhar nos horários devidos e separar um tempo pra me jogar de cabeça nos estudos, como sempre quis.

Que nada! A cada ano me sinto mais e mais atarefada. Olho pro criado-mudo e vejo livros empilhados e empoeirados que comecei e não tive tempo de terminar. Livros deliciosos que eu devoraria no primeiro final de semana. Mas o que são finais de semana mesmo??

Arrasto-me do serviço pra casa no meio da noite. Guardo minhas últimas energias do dia para a chegada triunfante no lar doce lar. Quando desço do carro meu cachorro espera ansioso o merecido carinho do dia, a planta que adoro na entrada de casa faz pose pra receber um afago, o marido espera com os olhos fixos no relógio uma palavra de consolo e afeto, os pais esperam o retorno da ligação querendo saber notícias.

Assim conforme o tempo diminui, as olheiras aumentam. Os livros se empilham. Os cursos se enfileiram. Os finais de semana acabam. A dívida comigo mesma fica maior e maior. Como nessa sucessão de frases curtas os meus dias vão passando sem vírgulas. No máximo ponto e vírgula pro almoço.

Só me dou ao luxo pra refletir quando coloco a cabeça no travesseiro. O corpo está tão cansado que caio no sono antes de completar o pensamento.

E eu, que não reclamo de trabalho, só sei contar os dias para as férias. A repetição é inevitável e vou me sentindo irritantemente repetitiva o tempo todo. Minha produtividade está tão gasta como sola de sapato velho. Aquele que eu usei o ano inteiro pra baixo e pra cima sem dar folga. E folga é justamente a palavra que não sai da minha cabeça. Folga, acredite, pra poder fazer um monte de coisas. Pintar quadros, ler livros, escrever livros, comer frutas, andar descalço, estudar novos idiomas, jogar conversa fora, me esticar na rede, ver filme juntinho, dormir fora de hora, acordar sem despertador.

Tudo isso pra mim são promessas velhas, vindas de uma política sádica, e só discursadas no ano novo. Mas quem sabe eu me surpreenda em 2009. Estique o tempo, a diversão, a família e pondere o trabalho. Ops! Comecei a planejar de novo!

Ando em círculos para evitar que a falta de tempo vire uma prática, sem me dar conta que o cíclico já virou hábito. Sequer poderia dar um ponto final nisso. O mais seguro seria um ponto quadrado pra não cair redondamente no mesmo erro. O jeito é torcer por um 2009 quadrado e ir aparando as arestas sem pressa. Bolinhas só no all star que eu desejo comprar (se eu tiver tempo).

Corações saem pela boca quando suspiram...


Olho ao redor e vejo pessoas perdidamente apaixonadas. Percebo que apesar das diferenças de gostos, estilos de vida, modo de pensar, elas ficam exatamente iguais quando o assunto é “ele”.


Os sintomas são tão aparentes como os olhos, transparentes de amor.


A dor de barriga, acredite, é um dos sintomas do amor.


Ela entra no msn e derrepente do “online” ele muda o status para “volto logo”. Ela automaticamente deduz que depois daquele encontro - duas semanas atrás - ele só pensa em fugir dela. Resultado: dor de barriga.


Volta do banheiro com cara espremida, igual o coração. Pequenininho, pequenininho.


Volta para o computador e segundos depois testemunha ele ficar online de novo. Na hora ela emenda. “Ufa! achei que fosse dor de barriga, era só uma dor no estômago”. Tradução: “ufa! Achei que ele estava fugindo de mim. Ele só tinha ido ao banheiro.”.


Esse tipo de coisa acontece o tempo todo no amor.


A outra colega, super da vibe, cantarola músicas que num passado recente odiava como o sertanejão “eu sei de tudo o que passa nessa tua vida, eu sei que assim como eu você não está feliz...”. enquanto canta, lembra um pouquinho dele. Em seguida, lembra um pouquinho dele e canta. Segundos depois, o cérebro dela já associou a música e o sertanejão vira ele em pessoa. Só de ouvir, quando está sozinha, ela começa a chorar. Num momento de fragilidade ela manda mensagem. Ele não responde.


No dia seguinte ela chega ao serviço toda arrumada, pra provar a ela mesma o quanto é linda, mas está destruída em pedacinhos por dentro.


O celular toca, músicas alegres. Ela atende na eterna esperança de ser ele. Passa o dia todo assim. Quando o silêncio na sala é tão alto que ela é capaz de ver com clareza o que sente por ele, começa a cantarolar de novo. A mesma música. Ele.


Em resposta a mensagem, ele liga um dia depois. Fala da vida, dos problemas, comenta as atitudes, revela sonhos. Ela do outro lado da linha se esparrama na cama e absorve a tudo com sorrisos eternos grudados na cara. Em momentos mais aflitos da ligação, anda de um lado pro outro enquanto conversa tentando pensar e dar como resposta imediata o que ele precisa ouvir.


Ele desliga, ela suspira.


Eles nem imaginam o tamanho do amor que elas sentem. Por que o amor contagia o ego. E o ego só não fica maior do que o próprio amor. Varia entre “eu sou do tamanho do mundo” e momentos de quase humilhação do tipo: “me ame do jeito que eu quero, por favor.”


O pior do amor é que você passa por tudo isso consciente. Vê os fatos e os transforma em coisas maiores, menores ou até finge que nunca existiram que é pra continuar saboreando a delícia de conversa daquela última saída juntos.


Você não tem o compromisso de ligar de novo, nem ele. Essa é a regra do início. Mas e quando não passa do início nunca e você pega o telefone várias vezes pra ligar à noite? E quando entra no msn só pra ver se ele está online, sem falar nada com ele o dia inteiro, mesmo que tenha frases prontas entaladas na garganta em formato de coração? E quando finalmente vê ele de novo, de perto, e finge ser outra pessoa, aquela amiga de sempre, quase desinteressada nele, mas não muito! Senão ele se desinteressa de você. Então você reata aquelas conversas de sempre, porque o “novo” você já sente há tanto tempo que perdeu o sentido de ser dito. Compartilha com ele as mesmas risadas. Começa a admirar coisas porque sabe que ele também iria gostar. E nessa ilusão de ver ele antes mesmo de você, acaba sendo ele 24 horas por dia e, apenas, uma imitação de você quando está com ele.

Sonhar às vezes custa caro


Há quem diga que sonhar não custa nada. Eu já tenho outra teoria. Sonhar pode custar caro.

Em um antigo relacionamento um ex vivia tendo sonhos em que eu estava traindo ele. Resultado, nós terminamos – não, o motivo do término não foi traição – mas confesso que já estava interessada por outro. Isso mesmo, apenas interessada.

Hoje em dia estou casada. O amor da minha vida dorme e acorda do meu lado. E se engana quem acha que por que casou a vida vira uma fonte de certezas e segurança. Que nada! Agora sou eu quem tem sonhos estranhos. Ou melhor, pesadelos! (Será isso um sintoma do amor – risos – mais provável da insegurança.)

Numa análise mais profunda do subjetivo, não sei se o sonho da traição atraiu o término do relacionamento e aproximou uma nova pessoa à minha vida. Ou, se é mesmo verdade o que lí num livro um dia “os sonhos são a expressão do nosso sub-consciente. Tudo o que a gente atrai é inconsciente ou consciente.” Portanto não seria o sonho o final de tudo.

Hoje temo que a insegurança que sinto no dia-a-dia se transforme em sonho (ou pesadelo) e desabe com tudo. Tudo mesmo. Afinal estamos falando de um casamento. Aquilo que a gente “sonha” ser pra vida inteira. E olha que ironia: o que começou com um sonho pode terminar com um sonho. Às vezes também pode terminar com novos sonhos, novos projetos de vida. Meus e dele. Mas o ideal é que os casais consigam viver os sonhos juntos e não separados. Respeitando os limites e os desejos mais íntimos e surreais do outro. Isso na linguagem do “mundo dos sonhos” seria quase como voar sem precisar de asas e nem perder o chão.

Por isso, no auge do amor que sinto, escolho: se tiver que sonhar que seja de olhos bem abertos. Porque ultimamente sonhar de olhos fechados tem me jogado num abismo.

O consolo é: nada melhor depois de um pesadelo, abrir os olhos (ainda que isto seja às 6 da manhã de um final de semana, justamente o dia que você gostaria de dormir até mais tarde) e pensar: ufa! foi só um sonho!

Papas na língua


Eu sempre quis ser daquelas que fala tudo o que pensa, sem “papas na língua”. Mas definitivamente não faz meu estilo ser tão sincera a ponto de tornar público tudo o que penso. E quando fiz isso na última festa entre amigos, fiquei tão constrangida que perdi metade da festa me lamuriando de ter falado sem papas.

A sinceridade dói mais em mim que nos outros. Assim como tem chá pra tudo, devia ter um chá pra curar a dor da sinceridade.

Minha covardia se mascara de gentileza. Algo do tipo, não falo a verdade para não ofender o próximo.

E no meu caso, quanto menos próximo menos tenho a obrigação de dizer a verdade.

Desde cedo medi milimetricamente as palavras. Achava-me sábia o suficiente para perceber o erro e ficar com dó de mostrar a verdade.

Até que dei o primeiro conselho na vida. Aí virou festa!

Recomendava tudo pra todo mundo.

Dava pitaco até na vida de quem eu não conhecia.

A festa mais chata ficava engraçada quando encontrava alguém com problemas, os quais eu tentava solucionar em um segundo.

Dava conselhos, sem saber se daria certo ou não. Mas torcia.

Quando a primeira amiga chegou e disse: “você tinha razão.”... Aí me achei a rainha da cocada preta.

Me profissionalizei na arte de dar conselhos. Até pensei em fazer psicologia, pra poder desfilar por aí com um certificado embaixo do braço: “Palpiteira Oficial”.

Mas enquanto a preguiça permitia, eu me contentava com uma só faculdade.

Até que um dia me apaixonei de verdade e finalmente perdi a fala. Era o momento que eu mais esperava. Ver estrelinhas, contar segundos, comer brigadeiro chorando com um filme qualquer.

Quando vi que era recíproco, aí veio a segunda fase da paixão. Um momento único na vida. Quando você fala um turbilhão de coisas tentando fazer a pessoa entender seu modo de ser, pensar, agir... falar. Apresenta a família, o cachorro, o vizinho, os amigos, os pais dos amigos.

Uma overdose de informação. Ele fica tão zonzo que acha que é amor. (rsrsrsrs)

O terceiro momento é mais equilibrado. Curte tudo juntinho. Cinema, pipoca, teatro, pearl jam e televisão.

No quarto momento, depois do “sim”, vem o cotidiano, irmão gêmeo do dia-a-dia e primo-irmão da rotina. Ele senta na poltrona com um “bom dia” largo.

A gente vai vivendo um dia após o outro. Sorrisos, lágrimas, cansaço, sorrisos, lágrimas, cansaço, cansaço, férias e começa tudo de novo.

Até que um dia a gente volta a ter papas na língua. O seu antigo eu se recupera da overdose de conselhos e passa a selecionar os amigos e as palavras. Me passou pela cabeça que talvez isso seja maturidade. Ouvir mais, falar menos.

Não dizer o que pensa começa com o chefe. Se consolida com o tempo, cria raízes e permanece.

Quando isso acontece você só não tem papas na língua pra uma pessoa. Sua alma gêmea. Pra esse, nem precisa falar nada. Assim como o pai na infância dá bronca só com o olhar, a alma gêmea sabe exatamente o que você achou disso e daquilo sem falar. Com ele, e só com ele, nem no pensamento consigo ter papas na língua.